SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E A LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: JULGAMENTOS IMPORTANTES MARCAM O MÊS DE AGOSTO

No último mês, o Plenário do Supremo Tribunal Federal se posicionou em duas ocasiões sobre recentes alterações introduzidas pela Lei nº 14.230/21 à Lei de Improbidade Administrativa. Ambos os pronunciamentos foram acompanhados de perto pela sociedade, por afetarem não apenas agentes públicos, mas também empresas que contratam com o Poder Público.

Em particular, no julgamento do Tema de Repercussão Geral nº 1.199, o STF decidiu se as novidades trazidas pela reforma deveriam retroagir para beneficiar acusados de cometer atos ímprobos na modalidade culposa, isto é, sem intenção comprovada de praticar as condutas tipificadas em lei. Além disso, o Supremo se pronunciou sobre o novo regime de prescrição introduzido pela Lei nº 14.230/21.

Por maioria de votos, o Supremo decidiu que as novas regras da Lei de Improbidade Administrativa são aplicáveis apenas a processos em curso, não dando ensejo à propositura de ação rescisória em face de condenações transitadas em julgado com base na modalidade culposa. Por outro lado, nos processos em andamento, caberá ao juízo competente examinar a existência de dolo específico para eventual caracterização do ato de improbidade.

Com referência à prescrição, a Lei nº 14.230/21 ampliou de cinco para oito anos o prazo de prescrição geral, a ser contado a partir da ocorrência do fato ou, no caso de infrações permanentes, do dia em que tiver cessado a ocorrência. Além disso, a referida norma introduziu regime de prescrição intercorrente, de forma a incentivar maior celeridade na tramitação de ações de improbidade.

Para o STF, as novas regras de prescrição não retroagem, por se tratar de normas de cunho processual. Nesse sentido, os novos marcos temporais para a prescrição geral e intercorrente são aplicáveis a partir de 26 de outubro de 2021, data de publicação da Lei nº 14.230/21.

Posteriormente, em sessão realizada em 31 de agosto, o Supremo julgou as Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 7042 e 7043, movidas pela Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal (Anape) e pela Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais (Anafe), tendo por objeto o questionamento de dispositivos legais que conferiam legitimidade exclusiva ao Ministério Público para propositura de ações de improbidade.

Além disso, o Plenário do STF decidiu por maioria que os entes públicos lesados possuem legitimidade concorrente para a propositura de ações de improbidade administrativa, tendo em vista o seu dever constitucional de zelar pela defesa do patrimônio público. Nesse sentido, o Plenário decidiu também por maioria que os entes públicos possuem competência para celebrar acordos de não persecução cível. Vale notar que a competência dos entes públicos é concorrente.

O Supremo não se pronunciou especificamente sobre a interação entre as advocacias públicas e o Ministério Público na condução de ações de improbidade administrativa. Essa problemática é verificada, por exemplo, em acordos de leniência fundados na Lei da Empresa Limpa, nos quais as autoridades frequentemente adotam posições conflitantes, gerando incertezas jurídicas. Espera-se, nesse sentido, que as autoridades realizem esforços de coordenação para que a competência concorrente afirmada no julgado do Supremo Tribunal Federal não se converta em obstáculo para a tramitação de ações de improbidade.

MINISTÉRIO DA ECONOMIA REALIZA CONSULTAS PÚBLICAS TRATANDO DA NOVA LEI DE LICITAÇÕES

O Ministério da Economia realizou consultas públicas em preparação à entrada em vigor da Nova Lei de Licitações, prevista para abril de 2023. Ambas as consultas têm grande relevância para melhoria da atividade de planejamento das contratações públicas, um dos principais objetivos do novo marco legal.

De 15 a 25 de agosto, o Ministério colheu contribuições referentes a minuta de instrução normativa que irá disciplinar a elaboração do Termo de Referência para a aquisição de bens e a contratação de serviços.

O Termo de Referência é o documento-chave da fase interna das licitações, devendo especificar adequadamente o objeto da licitação, a necessidade a ser satisfeita, o valor da contratação (estimado a partir de pesquisa de preços), e indicar a dotação orçamentária. Em linha com a tendência de informatização das contratações públicas, a minuta de instrução normativa prevê que o Termo de Referência será disponibilizado no âmbito do Sistema TR Digital, ferramenta informatizada integrante da plataforma do Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais.

A referida consulta pública recebeu um total de 104 contribuições, podendo ser acessada  aqui.

Além disso, o Ministério da Economia colheu (de 17 a 30 de agosto) contribuições sobre minuta de instrução normativa sobre procedimentos de seleção de imóveis para locação no âmbito da Administração Pública Federal nos termos da Nova Lei de Licitações. A minuta de resolução submetida a consulta pública prevê três modalidades de contratos de locação a serem firmadas por entes federais, quais sejam:

I – locação tradicional: o espaço físico é locado sem contemplar os serviços acessórios, os quais serão contratados independentemente, como limpeza, administração predial, recepção, vigilância, controle de acesso, entre outros;

II – locação com facilities: o espaço físico é locado contemplando os serviços para a sua operação e manutenção, como limpeza, administração predial, recepção, vigilância, controle de acesso, entre outros; e

III – locação built to suit – BTS: o locador procede à prévia aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então especificado pelo pretendente à locação, a fim de que seja a este locado, prevalecendo as condições livremente pactuadas no respectivo contrato e as disposições procedimentais previstas na Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991.

Além disso, a minuta de resolução dispõe sobre a realização de chamamento público pela Administração com o objetivo de prospectar no mercado imóvel disponível para locação que atenda a suas necessidades específicas. A depender do resultado do chamamento, o ente público deverá realizar procedimento licitatório pelo critério de julgamento (a) menor preço ou maior desconto; ou (b) maior retorno econômico.

NOVA LEI DE LICITAÇÕES – ATUALIZAÇÃO DE DIRETRIZES PARA ELABORAÇÃO DE ESTUDO TÉCNICO PRELIMINAR

No dia 09/08/2022, foi publicada a Instrução Normativa nº 58/2022 ("IN 58/2022") da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia ("SEGES"), pela qual foram atualizadas as diretrizes relativas ao Estudo Técnico Preliminar ("ETP"). As novas exigências são aplicáveis às contratações de bens e serviços da Administração Pública Federal, bem como aos contratos firmados por outras esferas a partir de transferência voluntária de recursos federais.

A IN 58/2022 visa aprimorar a etapa de planejamento das contratações públicas de forma a otimizar o dispêndio público, em linha com previsões contidas na Nova Lei de Licitações sobre a fase preparatória da licitação.

No ETP, o ente público licitante deverá evidenciar o problema a ser resolvido e a solução mais eficiente, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica, socioeconômica e ambiental da contratação. O ETP deverá estar alinhado com o Plano de Contratações Anual e com o Plano Diretor de Logística Sustentável, além de outros instrumentos de planejamento da Administração. Caso se conclua pela viabilidade do objeto, o ETP dará base ao anteprojeto, ao termo de referência ou ao projeto básico da contratação, conforme aplicável.

Para além da etapa de planejamento, a nova diretriz ressalta o crescente esforço de digitalização do Governo Federal ao prever que os ETPs deverão ser elaborados no Sistema ETP Digital, o qual disporá de indicadores de performance, salientando-se os estudos cujas contratações culminaram nas maiores avaliações do desempenho do contratado, nos termos do art. 88, § 3º da Lei nº 14.133, de 2021.

Assegurar que o planejamento ocorra da forma mais eficiente possível é uma preocupação compartilhada com empresas que contratam com o setor público, de forma a mitigar risco de questionamentos envolvendo a regularidade das referidas contratações.

A IN nº 58/2022 pode ser acessada clicando  aqui.

STF JULGA CONSTITUCIONAIS TAXAS DE FISCALIZAÇÃO DA MINERAÇÃO ESTADUAIS

Em 01/08/2022, o Supremo Tribunal Federal julgou constitucionais as leis dos estados do Pará, do Amapá e de Minas Gerais, que criaram taxas referentes à fiscalização de atividades minerárias.

No julgamento concomitante das Ações Diretas de Inconstitucionalidade n° 4785, 4786 e 4787, o Supremo avaliou a competência dos estados para a criação das referidas taxas, bem como a proporcionalidade das respectivas bases de cálculo utilizadas, cujo critério é, resumidamente, o faturamento do empreendimento bem como o seu impacto ambiental e social (o que leva em consideração o volume de minério extraído).

O entendimento foi formado no sentido de que as taxas teriam natureza extrafiscal, pois objetivam desestimular atividades de forma desproporcional a seu impacto social e ambiental. O Supremo considerou, ainda, que em sendo o exercício do poder de polícia de competência comum entre a União e os estados, a fixação das taxas pelos estados seria uma forma válida de viabilizar a efetivação de referido poder de polícia.

Ainda que o entendimento firmado sobre a competência comum entre os estados e a União tenha sido unânime na Corte, houve divergência com relação à proporcionalidade das taxas. Em votos vencidos, os Ministros Gilmar Mendes, André Mendonça e Luís Roberto Barroso consideraram que, além da desproporcionalidade, haveria uma situação de bitributação. Isso porque já existiriam normas federais voltadas à fiscalização de atividades mineradoras, com taxas que consideram, do mesmo modo, o impacto ambiental dos empreendimentos.

Assim, prevaleceu o entendimento da competência de fiscalização e proporcionalidade das taxas instituídas pelos três estados – Pará, Amapá e Minas Gerais. Esta decisão poderá estimular a criação de taxas da mesma natureza por outros entes federativos.

ANVISA PROÍBE UTILIZAÇÃO DE CARBENDAZIM NO BRASIL

Em 08/08/2022, foi publicada, no Diário Oficial da União, a Resolução de Diretoria Colegiada ("RDC") nº 739/2022, a qual proíbe a utilização do ingrediente ativo Carbendazim em produtos agrotóxicos no país. A RDC nº 739/2022 prevê que tal proibição alcança todos os produtos técnicos e formulados à base desse ingrediente ativo atualmente registrados ou com pleito de registro no Brasil.

De acordo com o sistema Agrofit do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento ("MAPA"), o composto está entre os 20 agrotóxicos mais utilizados no Brasil, sendo largamente empregado na composição de fungicidas em plantações de algodão, citros, feijão, soja e trigo.

A proibição se deu em razão de decisão proferida em ação civil pública na qual foi solicitada reavaliação toxicológica do Carbendazim por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária ("ANVISA"), com base em supostos riscos decorrentes do produto para a população rural em particular. No âmbito da reavaliação, a Gerência-Geral de Toxicologia da ANVISA concluiu pela proibição do composto devido ao seu potencial de causar mutagenicidade, toxicidade para a fisiologia reprodutiva e toxicidade para o desenvolvimento embriofetal e neonatal e da impossibilidade de determinação de limiares seguros de exposição humana.

A RDC nº 739/2022 prevê a proibição gradual e contínua do emprego do referido ingrediente ativo. A produção de produtos formulados com Carbendezim será proibida a partir de 08/11/2022. Já a comercialização de produtos formulados com a Carbendezim será proibida a partir de 08/02/2023. Por fim, a partir de 8.8.2023 será proibida a exportação de produtos técnicos e formulados com Carbendezim.

Ressalta-se que a RDC não estabeleceu prazo de proibição da utilização dos produtos já adquiridos por agricultores, pessoas jurídicas ou físicas, indústrias de tratamento de sementes, destinados ao uso final.

O descumprimento das disposições da resolução constitui infração sanitária, sem prejuízo das penalidades civis e penais cabíveis.

A RDC nº 739/2022 entrou em vigor na data de sua publicação e pode ser acessada  neste link.

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