O licenciamento ambiental no Brasil, uma ferramenta essencial para o desenvolvimento sustentável, tem sido alvo de intensos debates. Com a aprovação do Projeto de Lei (PL) nº 2.159/2021 pela Câmara dos Deputados nessa quinta-feira, 17 de julho, o texto que cria novas regras para o processo de licenciamento no país agora segue para sanção presidencial. Considerando as controvérsias desse projeto, a sócia de Direito Ambiental do KLA Advogados, Flávia Marcílio, preparou uma análise sobre os principais pontos envolvendo o tema:
O PL do Licenciamento: Uma Resposta Necessária, mas com Cautela. O PL nº 2.159/2021 (antigo PL 3.729/2004) surgiu como uma proposta para reformar o licenciamento ambiental no Brasil. Afinal, percepções de que o atual sistema é moroso, burocrático e obsoleto são comuns, considerando as normas que datam de décadas passadas e têm uma infinidade de regulamentações complementares que criam um cenário de grande complexidade. Essa realidade é um dos fatores do chamado “Custo-Brasil”, que acaba por impactar investimentos e travar projetos importantes.
Após 20 anos de discussão, o texto aprovado pela Câmara busca modernizar e agilizar os processos, reduzindo a burocracia e tornando o ambiente de negócios mais atraente. No entanto, há algumas observações a serem feitas sobre as novas regras:
Principais disposições do PL. O texto cria a chamada Licença Ambiental Especial (LAE) para empreendimentos considerados “estratégicos”, a fim de facilitar seu trâmite de aprovação a partir da emissão de uma licença única. Além disso, prevê a ampliação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para atividades de médio impacto ambiental, como documento “auto declaratório” para garantir celeridade e eficiência no desenvolvimento dos projetos maiores. Outro ponto a é previsão de dispensa de licença ambiental para algumas atividades, incluindo as do setor agropecuário, saneamento e energia. Por fim, o PL traz outras alterações relacionadas à área de mineração e à proteção dos biomas brasileiros e de outras áreas protegidas, como unidades de conservação e comunidades indígenas.
Os Riscos Ocultos da Simplificação Excessiva. A busca por “destravar” investimentos levanta preocupações significativas. Uma simplificação excessiva ou a desregulamentação podem, paradoxalmente, levar a mais problemas do que soluções. A ausência de dados técnicos robustos, o enfraquecimento da supervisão e a ambiguidade na redação da lei são elementos que podem fundamentar futuros desafios legais em bases constitucionais, ambientais e de direitos humanos. Ou seja, o que se pretende agilizar pode acabar em prolongadas batalhas judiciais e danos reputacionais para as empresas e para o país.
Contramão dos Compromissos e Demandas Atuais. Ademais, uma abordagem que flexibilize excessivamente as regras ambientais caminha na contramão dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em relação à sustentabilidade. Mais do que isso, ignora as crescentes demandas do mercado global por boa governança socioambiental e a crescente importância dos critérios ESG (Environmental, Social, and Governance). Empresas e investidores buscam cada vez mais empreendimentos que demonstrem responsabilidade ambiental. Ignorar essas expectativas pode resultar na perda de investimentos essenciais e na deterioração da credibilidade do país.
O Caminho para um Licenciamento Robusto e Sustentável. O verdadeiro desafio reside em construir uma legislação que, de fato, modernize e agilize o licenciamento, com tecnologia, base única de informações ambientais, proteção de áreas e comunidades vulneráveis, que são pilares basilares da Constituição Federal: a proteção ambiental, a segurança jurídica para todos os envolvidos, a participação social e a responsabilidade. Um sistema de licenciamento robusto não deve ser visto apenas como uma barreira burocrática, mas como um instrumento estratégico. Ele pode, inclusive, incentivar e reconhecer boas práticas ambientais, diferenciando os empreendedores responsáveis e garantindo um desenvolvimento verdadeiramente sustentável e próspero para o Brasil.
Conclusão: A modernização do licenciamento ambiental é, sem dúvida, necessária. Contudo, essa modernização deve ser inteligente e equilibrada, buscando a eficiência sem abrir mão da eficácia na proteção do nosso patrimônio ambiental e na garantia da segurança jurídica. Portanto, com relação ao PL nº 2.159/2021, será preciso aguardar a sanção do Presidente da República, em meio a tantas discussões sobre a implementação dessas regras, e acompanhar os impactos dessas mudanças no processo de licenciamento no país.
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