É POSSÍVEL A IMPUTAÇÃO SIMULTÂNEA, AO MESMO RÉU, DO DELITO ANTECEDENTE E DO CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO, DECIDE STJ

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça ("STJ") decidiu que é possível a imputação ou atribuição simultânea do delito antecedente e do delito de lavagem de dinheiro ao mesmo réu (autolavagem). No caso concreto, uma organização criminosa teria providenciado a elaboração de um esquema de venda de decisões judiciais no qual organizações sociais de credores trabalhistas do Estado do Rio de Janeiro eram incluídas em Plano Especial de Execução da Justiça Trabalhista.

Para tal inclusão, as organizações sociais deveriam contratar determinado escritório de advocacia que, ao receber os honorários decorrentes dos depósitos do Plano, repassavam os valores para os integrantes da organização criminosa, que compreendia, dentre outras pessoas, magistrados da justiça do trabalho, advogados e o então governador do Estado do Rio de Janeiro.

Diante dos fatos, o Ministério Público Federal ("MPF") propôs denúncia contra os integrantes da organização criminosa. Na resposta à acusação de um dos magistrados denunciados por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, alegou-se que não se poderia imputar o crime de lavagem de dinheiro, uma vez que a conduta de receber os valores caracterizaria somente o delito de corrupção passiva na modalidade de receber indiretamente – ou seja, por meio do escritório de advocacia – vantagem indevida.

A Ministra Relatora, Nancy Andrighi, desconsiderou os argumentos da defesa e manteve o recebimento da denúncia em relação aos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Para a Ministra, o delito de lavagem não poderia ser absorvido pelo delito de corrupção, uma vez que "não é possível ao agente, a pretexto de não ser punido pelo crime anterior ou com o fim de tornar seguro o seu produto, praticar novas infrações penais, lesando outros bens jurídicos". A Ministra foi acompanhada, por unanimidade, pelos demais Ministros.

A decisão reconhece a possibilidade de o denunciado responder, ao mesmo tempo, pelo delito antecedente e pela lavagem de dinheiro, mas suscita dúvidas. Isso porque, no caso concreto, o recebimento da vantagem indevida teria se ocorrido indiretamente, por meio de escritório de advocacia, o que já está previsto na redação do próprio delito de corrupção passiva. Assim, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, considerando que o crime de lavagem de dinheiro pressupõe um crime antecedente previamente consumado, é necessário observar a realização de atos posteriores capazes de ocultar ou dissimular os valores provenientes da corrupção.

A JUSTIÇA BRASILEIRA PODE JULGAR CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO AINDA QUE PARTE DOS ATOS DE LAVAGEM TENHA SE DADO EM TERRITÓRIO ESTRANGEIRO, DECIDE O STF

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal ("STF") decidiu que a Justiça Brasileira pode julgar crime de lavagem de dinheiro ainda que parte dos atos de lavagem tenham se desenvolvido em território estrangeiro. No caso concreto, uma pessoa de nacionalidade estrangeira e que residia em outro país foi denunciada pelo Ministério Público Federal ("MPF") pelo delito de lavagem de dinheiro decorrente de corrupção praticada no Brasil. Em sede de Habeas Corpus, a defesa alegou que as transações bancárias imputadas como atos de lavagem haviam sido praticadas na Suíça e não no Brasil, de modo que a lei brasileira não seria aplicável ao caso.

Após o Habeas Corpus ter seu seguimento negado por decisão monocrática, a defesa do denunciado interpôs recurso de Agravo Regimental, para que o recurso fosse analisado pela Segunda Turma. Em seu voto, o Ministro Relator, Edson Fachin, salientou que "atos de lavagem também teriam sido praticados no Brasil ainda que parcialmente" e que o Brasil se comprometeu a combater o delito de lavagem de dinheiro "ao aderir à Convenção das Nações Unidas contra o crime organizado transnacional (Decreto 5.015, de 2004, art. 6º da Convenção de Palermo)". Segundo o Ministro, isso faria da Justiça Brasileira competente para a apuração do suposto delito no caso concreto.

Ademais, o Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, salientou que o Superior Tribunal de Justiça ("STJ") firmou entendimento de que, uma vez "praticados os crimes antecedentes ao delito de lavagem de dinheiro em prejuízo da Administração Pública brasileira [como é o caso da corrupção] [...], ainda que porventura os atos de lavagem tenham-se realizado exclusivamente no estrangeiro, subsiste a competência do Poder Judiciário brasileiro para processar e julgar os fatos". Com esse entendimento, a Segunda Turma negou o provimento ao Habeas Corpus, por unanimidade, e determinou o prosseguimento da Ação Penal.

A decisão estabelece parâmetros para a fixação de jurisdição quando se trata de crime de caráter transnacional. Dessa forma, desde que os delitos antecedentes tenham sido praticados em desfavor da Administração Pública brasileira ou que parte dos atos de lavagem tenham sido praticados no Brasil, torna-se competente a Justiça Brasileira para apurar o caso.

REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS SOMENTE PODE SER ENCAMINHADA AO MINISTÉRIO PÚBLICO APÓS DECISÃO FINAL NA ESFERA ADMINISTRATIVA, DECIDE STF

O Plenário do Supremo Tribunal Federal ("STF") decidiu que a representação fiscal para fins penais somente pode ser encaminhada pelo Fisco ao Ministério Público nos casos de suspeita de crimes tributários praticados por particulares (arts. 1º e 2º, Lei 8.137/90) e crimes contra a Previdência Social (arts. 168-A e 337-A, do Código Penal), depois de proferida decisão definitiva na esfera administrativa a respeito da exigibilidade do crédito tributário correspondente.

No caso concreto, a Procuradoria-Geral da República ("PGR") apresentou Ação Direta de Inconstitucionalidade ("ADI 4980") para que fosse declarado inconstitucional o artigo 83 da Lei 9.430/96 com redação dada pela Lei 12.350/2010, que prevê exatamente o teor da decisão do STF. Segundo a PGR, o artigo 83 da Lei 9.430/96 seria inconstitucional, pois a Lei 12.350/2010, que lhe deu a redação, trata-se de uma conversão de Medida Provisória em lei. Dessa forma, como medidas provisórias não poderiam legislar sobre Direito Penal ou Direito Processual Penal, cuja competência é exclusiva da União (Poder Legislativo), a redação dada ao artigo 83 seria inconstitucional, já que medidas provisórias são editadas pelo Poder Executivo.

Em seu voto, o Ministro Relator, Nunes Marques, entendeu que o artigo 83 da Lei 9.430/96 não dispõe sobre questões de Direito Penal ou Processual Penal, pois as disposições do artigo se destinam apenas aos agentes fiscais e não ao judiciário. Assim, a medida provisória que foi convertida na Lei 12.350/2010 não regulamentaria assuntos privativos da União e, consequentemente, não seria inconstitucional a redação do artigo 83 da Lei 9.430/96. O Relator foi acompanhado pela grande maioria dos demais Ministros.

Por fim, a decisão é salutar, uma vez que a finalidade da exigência prevista no artigo 83 da Lei 9.430/96 é evitar que haja apurações conflitantes na esfera administrativa e na judicial. Isto é, evitar que os agentes fiscais provoquem a autuação de Ação Penal com a possibilidade de a exigibilidade do crédito tributário seja suspensa ou extinta ante a possibilidade de impugnação e interposição de recursos no processo administrativo ainda em curso.

A MEDIDA DE INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NÃO PODE SER DECRETADA SOMENTE COM BASE EM DENÚNCIA ANÔNIMA, DECIDE STJ

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça ("STJ") decidiu que a medida de interceptação telefônica não pode ser decretada somente com base em denúncia anônima. No caso concreto, várias pessoas foram denunciadas por delitos de extorsão, associação criminosa, peculato e corrupção passiva. No entanto, a denúncia foi embasada em interceptação telefônica decretada a partir de denúncias anônimas, única e exclusivamente.

Irresignada, a defesa de três dos réus interpôs Recurso Ordinário em Habeas Corpus perante o STJ requerendo o reconhecimento da nulidade da interceptação telefônica. Em seu voto, o Ministro Relator, Sebastião Reis Júnior, afirmou que a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que a interceptação telefônica é inválida quando realizada somente com base em denúncias anônimas e não são empregadas diligências preliminares para a averiguação da veracidade das informações prestadas. Ademais, o Ministro observou que, no caso concreto, as denúncias anônimas foram os únicos elementos que embasaram a interceptação telefônica, o que vai contra o entendimento do Tribunal e da Lei 9.296/96 (Lei da Interceptação Telefônica).

Segundo o Ministro, baseado em outro precedente do STJ (HC nº 496.100/SP), "embora a denúncia anônima seja apta a ensejar a investigação dos fatos narrados, ela não tem o condão de, por si só, autorizar a adoção de medidas constritivas, tais como a busca domiciliar, a interceptação telefônica e a quebra do sigilo de dados.".

Com esse entendimento, foi dado provimento ao recurso dos réus para reconhecer a nulidade da interceptação telefônica decretada, de modo que o juiz de primeira instância deverá identificar provas derivadas, que deverão ser invalidadas.

A decisão consolida o entendimento de que a interceptação telefônica é uma medida investigativa de caráter excepcional, não podendo ser decretada com base em mera denúncia anônima, cuja lisura e veracidade somente podem ser verificadas após a realização de diligências preliminares e quiçá com a instauração de inquérito policial.

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