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O ambiente tributário brasileiro, marcado por sua complexidade e sua instabilidade, e com orientações definitivas sendo dadas muitas vezes pelo Judiciário, traz uma lição que os contribuintes, gostando ou não, não podem ignorar: a importância de continuamente se avaliar teses tributárias, com seu ajuizamento em tempo hábil. O alerta não é só jurídico, mas também econômico e concorrencial.
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Um exemplo emblemático foi o Tema 69 do STF (Supremo Tribunal Federal), que discutiu a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. Embora o julgamento de mérito tenha ocorrido em 2017, a definição sobre a chamada modulação de efeitos só foi dada em 2021.
Nela, o STF limitou o direito de reaver valores indevidamente recolhidos até a data da sessão de julgamento em 15 março de 2017, excetuando apenas quem já havia ajuizado ação até então. Ou seja: quem não buscou o Judiciário a tempo ficou impedido de recuperar valores pagos no passado.
Pelo lado do Poder Público, a modulação de efeitos é apresentada como um mecanismo de estabilidade, evitando impactos abruptos no orçamento. Na prática, contudo, ela cria um desequilíbrio concorrencial: empresas que se antecipam podem operar com custos tributários reduzidos, enquanto outras, muitas vezes concorrentes diretas, continuam oneradas. E essa diferença pode ser determinante na formação de preços, margens e investimentos – apenas definida pela data em que determinada ação foi ajuizada.
Outro caso que ilustra a relevância da questão é o Tema 985 do STF, que tratou da incidência de contribuição previdenciária sobre o terço de férias. O STF reconheceu a constitucionalidade da cobrança em 2020, mas novamente aplicou modulação. Desta vez, com base na publicação da ata de julgamento, para reconhecer o direito de crédito até 15 de setembro de 2020, mas apenas a quem já tinha ação ajuizada até então.
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No entanto, um ponto adicional chama a atenção: desta vez, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional pediu que o marco temporal passasse a ser não mais norteado pela data do julgamento de mérito, mas pela data do reconhecimento da repercussão geral, que seria anterior, alegando que isso seria necessário para desincentivar a litigiosidade que geralmente aumenta após a afetação de determinado tema e, mais ainda, próximo à data do julgamento de mérito.
Embora o relator no STF, o ministro Luís Roberto Barroso, não tenha acolhido essa diretriz ao recentemente julgar os embargos de declaração opostos no Tema 985, ele sinalizou que essa interpretação está em estudo e pode vir a ser considerada em futuros julgamentos. Se confirmada, inaugura-se um novo padrão, ainda mais restritivo para os contribuintes.
Com a reforma tributária do consumo em curso, esse movimento tende a se intensificar. A criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), sucessores do ICMS, do ISS, do PIS e da Cofins, já levanta potenciais controvérsias judiciais, inclusive algumas mais imediatas, envolvendo tributos já existentes e exigidos na rotina das empresas. Ou seja, as primeiras teses podem surgir antes mesmo de a reforma tributária estar plenamente implementada.
Entre elas, por exemplo, está a discussão sobre a inclusão ou não do IBS e da CBS na base de cálculo dos tributos que serão substituídos (como o ICMS e ISS) e, também, seus reflexos na base de cálculo do IRPJ e da CSLL no regime do lucro presumido. A discussão é se os novos tributos, calculados por fora e sem previsão expressa de inclusão em tais bases de cálculo, devem compô-las ou não. O fato é que, persistindo o cenário de incerteza, muito provavelmente essa resposta virá do Poder Judiciário.
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Esse contexto reforça um ponto crucial: acompanhar, analisar e ajuizar teses tributárias não é mera questão de “aposta jurídica”, mas de estratégia empresarial.
É importante ressalvar que aqui não se defende o ajuizamento, a todo custo, de ações infundadas, inundando o já abarrotado Judiciário. Ao contrário, o que importa, sim, é estar atento ao que se está discutindo e, com o devido assessoramento jurídico, avaliar a adequação da tese à realidade de cada contribuinte – não se descuidando de avançar a tempo com seu ajuizamento numa realidade como a brasileira, na qual as discussões tributárias mais relevantes acabam sendo definidas pelo Judiciário.
Afinal, empresas que deixam de agir correm o risco de suportar custos maiores que seus concorrentes diretos por longos períodos, perdendo competitividade em um mercado já pressionado.
A inteligência tributária deixou de ser função periférica no âmbito empresarial: é peça central na sustentabilidade dos negócios. Estar atento às discussões em curso e ajuizar as teses no momento certo pode significar a diferença entre competir em igualdade ou ficar permanentemente em desvantagem.
No tabuleiro da tributação brasileira, quem espera demais pode simplesmente perder o jogo – ou parecer ganhar, mas no fim não levar.
Originally Published by JOTA
The content of this article is intended to provide a general guide to the subject matter. Specialist advice should be sought about your specific circumstances.