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A recente Portaria n.º 292/2025/1 remove Hong Kong, o Liechtenstein e o Uruguai da lista de "países, territórios ou regiões com regimes fiscais claramente mais favoráveis". Estas jurisdições já não constavam há vários anos das listas da União Europeia de jurisdições não cooperantes — um fator que terá levado a Autoridade Tributária portuguesa a aceitar os pedidos formais de remoção da lista nacional.
Esta atualização é positiva: o mecanismo de revisão está ativo, a lista está em evolução e mostra que é possível, de facto, a remoção de jurisdições. Tendo em conta que vários grupos sob controlo chinês operam em Portugal através de estruturas sediadas em Hong Kong — um centro financeiro sofisticado e de longa tradição —, esta evolução é particularmente positiva.
Contudo, a lista continua a incluir diversas jurisdições — ilhas localizadas nas Caraíbas, nos oceanos Índico e Pacífico, bem como na Europa, países em África, no Médio Oriente e na América Central, entre outros. Nos termos da Portaria n.º 150/2004 (com as alterações subsequentes) e do artigo 63.º-D da Lei Geral Tributária, qualquer ligação a uma jurisdição listada desencadeia automaticamente uma presunção — ou mesmo uma certeza sob a veste de presunção inilidível — de abuso fiscal, sem que o contribuinte tenha oportunidade de demonstrar o contrário. Este mecanismo levanta sérias dúvidas quanto à conformidade com os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade. Na prática, a abordagem portuguesa mantém-se mais rígida do que os padrões mais flexíveis aplicados nos instrumentos da União Europeia e a lógica subjacente à manutenção desta lista negra merece um exame mais atento. As consequências são extensas: taxas de imposto mais elevadas, não dedutibilidade de despesas, tributação autónoma agravada, aplicação das regras CFC, inversão das regras habituais sobre o ónus da prova, acesso limitado a benefícios e isenções e exigências mais restritivas de retenção na fonte e de documentação.
Ainda assim, atividades empresariais perfeitamente lícitas podem envolver países, territórios ou regiões listadas na Portaria, sendo esse envolvimento baseado em razões igualmente legítimas e totalmente alheias à evasão fiscal. Importa sublinhar que várias dessas jurisdições — como os Emirados Árabes Unidos (EAU) — são partes em Convenções para Evitar a Dupla Tributação e/ou em Acordos Bilaterais de Investimento com Portugal. E isto suscita uma questão: como compatibilizar uma presunção de evasão fiscal que acarreta uma tributação agravada com tratados concebidos para promover e proteger o investimento no estrangeiro de residentes em Portugal, nomeadamente nos EAU? Devido ao pesado ónus probatório e ao risco de sanções, muitos contribuintes são dissuadidos de manter estruturas transfronteiriças legítimas quando envolvam estas jurisdições.
O regime da lista negra constante da Portaria n.º 150/2004 levanta, também, questões à luz de dois princípios constitucionais:
1. Igualdade / Não Discriminação. Contribuintes com estruturas economicamente semelhantes podem ser tratados de forma diferente apenas devido a uma ligação territorial, sem qualquer avaliação individualizada significativa.
2. Proporcionalidade. A presunção de abuso é excessivamente ampla, abrangendo situações de baixo risco ou não abusivas. Instrumentos mais equilibrados — como presunções ilidíveis ou mecanismos desafe harbor— poderiam aplicar-se com maior precisão aos casos genuínos de evasão.
Em contraste, os instrumentos da União Europeia — incluindo a lista de jurisdições não cooperantes — permitem uma apreciação mais diferenciada, lugar a prova de legitimidade e maior equidade processual. Alinhar o regime português com esses padrões reduziria o risco jurídico e promoveria maior proximidade com os princípios do direito constitucional e do direito da União Europeia.
Para grupos multinacionais, instituições financeiras, sociedades gestoras de participações sociais e outros setores afetados, este regime de presunção rígido pode desencorajar o investimento transfronteiriço legítimo ou até empurrar as empresas para a adoção de estruturas para maior opacidade, apenas para evitar serem erroneamente classificadas como abusivas e sujeitas a tributação agravada.
Neste contexto, os profissionais, os contribuintes com interesses transfronteiriços e os decisores políticos devem encarar a Portaria de 2025 como um ponto de partida, e não como um ponto de chegada. A verdadeira tarefa que se impõe é reformar a arquitetura jurídica do regime associado a esta listagem — e não apenas ajustar o seu conteúdo. Cada parte interessada tem um papel a desempenhar na contestação e remodelação deste quadro, para que melhor respeite os princípios fundamentais que o devem orientar.
Os contribuintes e os advogados devem continuar a defender garantias processuais mais robustas, oportunidades reais de contraditório e maior transparência nos critérios aplicados. Devem igualmente impugnar — e, quando necessário, litigar contra — decisões da administração tributária baseadas em presunções generalizadas sem uma avaliação individual adequada.
Do lado dos reguladores e legisladores, deve ser considerada uma evolução para regras mais flexíveis — que permitam aos contribuintes apresentar prova em contrário, estabeleçam mecanismos desafe harbore limitem as presunções a situações de risco claro e significativo. Medidas deste tipo ajudariam a garantir o cumprimento dos princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade e aproximariam o regime português dos padrões atualmente aplicados na União Europeia.
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