CRIADA COMISSÃO DE JURISTAS PARA REFORMA DA LEI DE LAVAGEM DE DINHEIRO

O Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, nomeou uma comissão de juristas para a reforma da Lei nº 9.613/98, também conhecida como "Lei de Lavagem de Dinheiro". Dentre os juristas nomeados, estão advogados, procuradores, juízes e acadêmicos especializados em criminalidade econômica. A comissão deverá apresentar o anteprojeto de reforma dentro do prazo de 90 dias.

A pretensão de reforma da Lei de Lavagem de Dinheiro é salutar por, ao menos, três razões fundamentais. A primeira diz respeito ao problema da larga amplitude do tipo penal, o que acaba possibilitando que qualquer destinação dada a um produto de determinado crime possa ser considerada ocultação, o que caracterizaria lavagem de dinheiro. A título de exemplo, em tese, a lei permite a interpretação de que o armazenamento de valores em espécie não declarados para evitar a incidência de imposto, portanto frutos de sonegação fiscal, possa ser enquadrado como lavagem de dinheiro, no modo ocultação, em vez de mero proveito do crime ou seu exaurimento.

Outra razão fundamental está diretamente relacionada com a controversa questão envolvendo o crime previsto no artigo 350, do Código Eleitoral, também intitulado por alguns como "Caixa 2" eleitoral. Referida conduta criminosa ocorre quando determinado político recebe valores a título de doação eleitoral, mas não os declara integral ou parcialmente para fins eleitorais. Nessa seara, os valores doados podem não ser ilícitos, mas qualquer destinação dada pelo político pode ser compreendida como lavagem dinheiro e não como um proveito do crime. Nem sempre se quer ocultar a origem dos valores, muitas vezes visa-se apenas ao uso da quantia sem a prestação de contas, o que foge do escopo do crime de lavagem de dinheiro.

A situação se complica quando a doação se dá em razão de corrupção. Nesse sentido, não é incomum a confusão acerca de qual crime configuraria a não declaração dos valores, uma vez que poderia constituir o crime previsto no artigo 350, do Código Eleitoral ou, ainda, o crime de lavagem de dinheiro por ocultação.

Por fim, espera-se que a reforma aborde a natureza jurídica do crime de lavagem de dinheiro enquanto crime instantâneo ou permanente, o que implicará em questões relevantes para fins de prescrição e possibilidade de prisão em flagrante. Tal questão, inclusive, já foi objeto da Ação Penal 863 no Supremo Tribunal Federal, oportunidade em que se decidiu ser permanente o crime de lavagem de dinheiro. Apesar do entendimento da Suprema Corte, é inegável que a definição da natureza jurídica do referido crime cabe ao legislativo, que poderá rever o posicionamento supracitado.

Por fim, é importante destacar que a verdadeira intenção da reforma legislativa não é propiciar um abrandamento do crime, como se tem veiculado em parte da mídia, mas, sim, proporcionar segurança jurídica a questões controvertidas e ainda sem respostas claras e sólidas pela lei ou jurisprudência.

STF SUSPENDE CONDENAÇÃO EM RAZÃO DE INICIATIVA PROBATÓRIA DO JUIZ DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio, suspendeu a condenação de um homem por uso de documento particular falso e contrabando, em razão de o juiz de primeira instância ter determinado a produção de provas que foram utilizadas para a condenação do acusado. A decisão foi proferida no julgamento de liminar em habeas corpus. O mérito do writ ainda pende de julgamento, e a Procuradoria-Geral da República apresentou parecer contrário à concessão da ordem.

No caso concreto, o Ministério Público não arrolou testemunhas, pois o acusado havia confessado o delito na fase policial, e os policiais haviam apreendido os documentos e produtos contrabandeados. Como o réu permaneceu em silêncio em seu interrogatório, na ausência de elementos probatórios para a acusação, o juiz determinou de ofício a oitiva dos policiais que fizeram a apreensão.

A decisão do Ministro Marco Aurélio, ainda que em caráter liminar, guarda considerável importância, pois buscou reforçar o modelo acusatório do processo penal brasileiro, estabelecido pela Constituição Federal. Isso implica dizer que as funções de investigar, acusar e julgar estão claramente estabelecidas e devem ser desempenhadas por autores diferentes do processo: Polícia Judiciária, Ministério Público e Juiz, respectivamente. Nesse sentido, a Lei n. 13.964/2019 introduziu o art. 3º-A ao Código de Processo Penal, que prevê: "O processo penal terá estrutura acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da atuação probatória do órgão da acusação".

O art. 156, II, do CPP permitia ao juiz determinar, ao longo da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante. Com as alterações introduzidas pela a Lei n. 13.964/2019, sobretudo quanto a vedação de o juiz substituir a atuação probatória do órgão de acusação, há de se interpretar que houve a revogação tácita do art. 156. Assim, o juiz só poderia determinar prova de ofício se for para dirimir dúvidas e, mesmo assim, para favorecer o réu, em consagração ao princípio do in dubio pro reo.

STJ FIXA CONDIÇÕES PARA A NECESSIDADE DE COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL PARA A OBTENÇÃO DE PROVAS

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a um Agravo Regimental em Recurso Especial que, dentre outras alegações suscitadas pela defesa de um indivíduo condenado por associação ao tráfico de drogas, buscava discutir a ilicitude de provas em razão da nulidade das interceptações telefônicas realizadas por empresa sediada no exterior.

Segundo os defensores do recorrente, em razão das informações interceptadas estarem armazenadas na sede da empresa de telefonia no Canadá, sua obtenção somente poderia se dar mediante a aplicação do Tratado de Assistência Mútua em Matéria Penal entre Brasil e Canadá (Decreto nº 6.747/2009). No entanto, a decisão do STJ foi diversa.

Segundo o Ministro Sebastião Reis Júnior, como os crimes foram praticados no Brasil, por pessoas residentes no Brasil e que trocaram mensagens em território nacional, é desnecessária a cooperação jurídica internacional, ainda que a sede da empresa de telefonia esteja sediada em outro país. A cooperação somente seria exigida em casos, por exemplo, de interceptação de pessoas residentes no exterior. O referido entendimento, inclusive, é dominante no STJ e já vinha sendo aplicado no âmbito da Operação Lava Jato.

Por fim, é importante destacar que o entendimento do STJ, além de delinear as situações em que é necessária a Cooperação Jurídica Internacional, tende a fornecer maior celeridade processual, uma vez que a requisição de informações de crimes sujeitos à jurisdição brasileira, por meio de ofício, tende a ser mais rápida do que o cumprimento de um pedido de cooperação com outro país.

MPF REALIZA MAIS DE 5 MIL ACORDOS DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL E BUSCA FOCAR EM DEMANDAS CRIMINAIS MAIS GRAVES

Após a Lei nº 13.964/2019, também conhecida como "Lei Anticrime", entrar em vigor, em 23 de janeiro de 2020, e introduzir o acordo de não persecução penal (ANPP), mais de 5.000 acordos já foram celebrados com o Ministério Público Federal (MPF). De acordo com dados do próprio MPF, foi possível verificar que os casos em que mais ocorreram a celebração do acordo envolviam crimes de natureza econômica, como contrabando ou descaminho (1.165), estelionato majorado (802), uso de documento falso (469), moeda falsa (285) e crimes contra o meio ambiente e patrimônio genético (200). Ademais, os acordos foram realizados em todos os Estados brasileiros e no Distrito Federal.

O ANPP é cabível quando o investigado confessa formal e circunstanciadamente a prática de infração sem violência ou grave ameaça, cuja pena mínima seja inferior a 04 anos. Além disso, o acordo é cabível quando for necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante determinadas condições ajustadas, como a reparação do dano ou a restituição à vítima, a renúncia de bens e direitos indicados pelo Ministério Público, a prestação de serviço à comunidade, o pagamento de prestação pecuniária ou outra condição indicada pelo Ministério Público.

É importante frisar que alto número de acordos celebrados no pouco tempo de vigência da lei indica um foco maior do MPF em questões criminais mais graves e complexas, de modo a não judicializar casos menos graves em que seja possível a compensação da vítima ou da sociedade sem um processo penal longo e custoso. Ademais, os acordos ajudam a minimizar os problemas de superlotação no colapsado sistema prisional brasileiro.

Por fim, ainda que muitos acordos estejam sendo realizados, a aplicação do ANPP ainda tem gerado muita discussão na jurisprudência e na doutrina. Dessa forma, espera-se que, com o passar do tempo, esses números continuem aumentando com maior segurança jurídica para as partes envolvidas.

The content of this article is intended to provide a general guide to the subject matter. Specialist advice should be sought about your specific circumstances.