Em decisão de 02 de julho de 2019, o Colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) autorizou a emissão de Certificados de Recebíveis Imobiliários (“CRI”) lastreado em despesas imobiliárias incorridas em momento prévio ao de sua emissão, ou seja, assentiu com o reembolso das despesas e custos através de oferta pública, desde que observados determinados requisitos.

A decisão é oriunda da consulta realizada pela XP Investimentos Corretora de Câmbio, Títulos e Valores Mobiliários S.A., a qual intentava verificar o posicionamento da Autarquia acerca da possibilidade de estruturação de operação de CRI lastreados em reembolso de despesas incorridas no setor imobiliário previamente à emissão dos CRI, diretamente alusivas à aquisição, construção ou reforma de imóveis, bem como de despesas predeterminadas, especificadas no termo de securitização e no instrumento de dívida.

Inicialmente, a Superintendência de Registro de Valores Mobiliários (“SRE”), em análise do tema, emitiu o Memorando nº 42/2019-CVM/SRE/GER-1, no qual declarou seu entendimento acerca da impossibilidade de estruturação de CRI com lastro imobiliário por destinação envolvendo reembolso de despesas imobiliárias, com base no fundamento que o direcionamento dos recursos captados pela emissão do CRI deve ocorrer após referida emissão e até a data de seu vencimento, de acordo com outros precedentes da CVM. Ainda, a área técnica afirmou que o “reembolso” seria aplicável somente aos casos de emissão dos chamados “CRI de Infraestrutura”, em razão da especialidade da Lei 12.431/11, que cria tratamento tributário diferenciado para emissão de CRI e outros valores mobiliários no âmbito de projetos de infraestrutura e que traz em seu escopo a possibilidade de reembolso de despesas incorridas no âmbito da emissão.

Com a submissão do tema ao Colegiado, cuja reunião ocorreu em 09 de abril de 2019, a Diretora Flávia Perlingeiro se manifestou em sentido contrário ao da SRE, entendendo ser admissível que em uma emissão de CRI por destinação haja o reembolso de despesas incorridas anteriormente à data de emissão.  Em seu voto, a Diretora entende que não há restrição temporal estabelecida em lei, bem como entende que não há descaracterização da natureza do crédito apenas pelo fato de o ônus ter sido suportado em momento prévio à emissão dos CRI, desde que um limite temporal seja estabelecido para a utilização do reembolso. Ainda, em sua visão, a estrutura está em consonância com os objetivos da Lei 9.515/97, vez que o reembolso favorece igualmente o setor imobiliário, mesmo que via mercado de valores mobiliários.

Em conclusão, Diretora votou, in verbis, “pelo reconhecimento da possibilidade de estruturação de CRIs com lastro em crédito imobiliário considerado por força de sua destinação, que envolva, parcial ou totalmente, o reembolso de despesas de natureza imobiliária de per si e predeterminadas, diretamente atinentes a aquisição, construção e/ou reforma de imóveis específicos, exaustivamente indicados na documentação da oferta, incorridas anteriormente à emissão dos CRIs [...]”. Ressalta, entretanto, que alguns requisitos deverão ser observados, quais sejam:

  1. As despesas imobiliárias que venham a ser reembolsadas devem ser detalhadas e especificadas no termo de securitização e no instrumento de dívida, indicando a identificação dos valores envolvidos, especificação individualizada dos imóveis vinculados aos quais as despesas se referem e indicação do Cartório de Registro de Imóveis em que esteja registrado e respectiva matrícula;
  2. As despesas devem ter sido incorridas em prazo igual ou inferior a 24 (vinte e quatro) meses de antecedência com relação à data de encerramento da oferta pública dos CRI; e
  3. As despesas devem ser objeto de verificação pelo agente fiduciário, que deverá ter acesso à todas as notas fiscais, escrituras e demais documentos que comprovem as despesas.

Referida decisão constitui um marco na indústria dos CRI, sendo certo que a possibilidade de reembolso de despesas imobiliárias incorridas no âmbito dos projetos e empreendimentos aos quais os recursos captados via oferta pública se destinam poderão ampliar e fomentar ainda mais o setor imobiliário brasileiro.

Por fim, como forma de facilitar a divulgação e compreensão do entendimento do Colegiado, foi recomendado que referido entendimento fosse refletido na Instrução CVM n° 414/04, estando tal alteração, contudo, sujeita aos procedimentos da CVM aplicáveis às revisões normativas.

A manifestação da SRE e a ata de reunião do Colegiado podem ser acessadas, respectivamente, nos links:

- http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/decisoes/anexos/2019/20190702/1365SRE.pdf

- http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/decisoes/anexos/2019/20190702/1365DFP.pdf

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