Em 2019, a União Europeia apresentou seu Pacto Ecológico (clique aqui), com o objetivo de se tornar o primeiro continente com impacto neutro no clima até 2050. De lá para cá, diversas estratégias vêm sendo desenvolvidas dentro desse pacto, incluindo, dentre outros, planos de ação para economia circular, biodiversidade e descarbonização da matriz energética.

Como parte do pacto, o Parlamento Europeu aprovou, em 06.12.2022, um regulamento específico para enfrentamento do desmatamento atrelado a commodities consumidas na Europa, como óleo de palma (azeite de dendê), soja, café, cacau, madeira, borracha e gado e seus derivados. Com isso, a União Europeia espera contribuir para redução do desmatamento ao redor do mundo, de onde vêm as matérias-primas e produtos consumidos na Europa.

É inegável o impacto que esse regulamento trará ao agronegócio brasileiro. Quando for implementada, a norma exigirá que, para entrar no mercado europeu, as empresas importadoras e exportadoras apresentem uma declaração de due diligence, pela qual venham a garantir que os produtos comercializados não tenham tido origem em área desmatada ou degradada desde 31.12.2020. Todos os documentos relativos à regularidade da origem do produto e que tenham passado pela auditoria devem ser mantidos pelo período de 5 anos.

Vale lembrar que a supressão de vegetação para abertura de área de cultivo ou criação de animais não é proibida no Brasil, cuja legislação concilia preservação ambiental com desenvolvimento econômico (art. 170 c/c art. 225 da CF/1988). O que a legislação acertadamente requer é que sejam respeitadas as restrições ambientais nos imóveis rurais (Lei 12.651/2012 – Código Florestal) e que as supressões sejam previamente autorizadas e devidamente compensadas. A conotação negativa do termo desmatamento está associada ao corte não autorizado e, portanto, ilegal e não à supressão de vegetação propriamente dita.

Porém, em muitos casos, especialmente na cadeia produtiva da agropecuária, a regularidade ambiental da propriedade rural do criador de animais é difícil de ser rastreada. Isto porque não há documento legal que possa ser exigido do fornecedor que comprove, com a segurança que o empreendedor precisa, a regularidade ambiental da sua propriedade. O Cadastro Ambiental Rural – CAR poderia servir a esse papel, mas passados 10 anos de sua instituição, não se avançou na sua homologação. Até que isso aconteça, o CAR deve ser considerado com ressalvas, visto que é autodeclaratório, pode ser alterado a qualquer momento via internet, não foi validado pelas autoridades em relação a eventuais sobreposições de área, regularidade de reserva legal e área de preservação permanente e assim por diante. Em imóveis que possuam reserva legal compensada via servidão ambiental em imóveis de terceiros ou que a mantenham em regime de condomínio com outras propriedades, a confirmação da regularidade é ainda mais complexa.

Empresas da agropecuária têm desenvolvido de forma voluntária mecanismos internos para mapeamento e rastreamento da sua cadeia de fornecedores com a utilização de mapas georreferenciados, monitoramento via satélite e, em alguns casos, até com visitas in loco. O processo de auditoria de fornecedores já está estabelecido em muitas delas e a tendência é que seja aprimorado. No cenário que se desenha, no contexto ESG, quanto mais informações as empresas conseguirem reunir de seus fornecedores, inclusive com relação ao cumprimento de normas trabalhistas, de direitos humanos e respeito a populações indígenas e quilombolas, melhor. Ir além do que se pede na legislação é a nova regra do jogo em uma nova sociedade que não tolera mais o lucro pelo lucro e que passou a demandar que empresas tragam efetivo impacto positivo à vida das pessoas e para o meio ambiente.

Espera-se que as agências ambientais brasileiras acompanhem essas tendências e atuem no sentido de promover mais segurança jurídica com relação à regularidade ambiental dos imóveis rurais, controle do desmatamento ilegal e homologação do CAR. Além disso, espera-se que haja integração das informações das agências com as indicações das propriedades de origem e destino no Guia de Trânsito Animal – GTA, otimização da emissão de certidões via internet e implementação de outras ferramentas confiáveis. Tudo isso para viabilizar que as empresas brasileiras atendam às crescentes exigências do mercado internacional.

The content of this article is intended to provide a general guide to the subject matter. Specialist advice should be sought about your specific circumstances.